segunda-feira, 30 de março de 2009


5 Questões pertinentes acerca do Desenvolvimento Humano


1. O desenvolvimento do indivíduo é determinado pelo seu genótipo?

2. Qual a influência dos factores ambientais na formação do ser humano?

3. Que importância assumem as "crises" no desenvolvimento psíquico do indivíduo?

4. Que papel assume o sujeito no seu próprio desenvolvimento?

5. Até que ponto as teorias implícitas influenciam a acção pedagógica e a escolha de métodos pelo professor, interferindo com o desenvolvimento dos seus alunos?
Ditado Popular X Psicologia do Desenvolvimento


Os ditados populares surgem espontaneamente de experiências e necessidades quotidianas, reflectindo a sabedoria do povo e, sobretudo, as suas crenças e tradições. Todos os ditados populares emergem num contexto sociocultural e histórico que é preciso não negligenciar, perspectivando-os como um conhecimento fragmentado, restrito e por isso mesmo impossível de ser generalizado. Neste enquadramento, é fácil perceber o porquê da existência de provérbios completamente antagónicos, repletos de ambiguidade que reflectem interesses, valores e emoções e classificam comportamentos e atitudes numa linguagem imprecisa carente de especificidade.

Apesar de tudo, as crenças do senso comum enraízadas nos valores e necessidades quotidianas, parecem prevalecer sobre o conhecimento científico apresentando uma continuidade ao longo do tempo que não nos pode ficar indiferente. Esta longevidade constitui um alerta para a importância de consciencializar os profissionais da educação para a influência deste tipo de saber empírico e subjectivo que nunca foi sujeito a qualquer tipo de verificação e que não raras vezes contradiz o saber científico e interfere na nossa vida profissional e pessoal.

Não será concerteza difícil enumerar uma série de ditados com os quais podemos estabelecer associações com o desenvolvimento humano e que contradizem em parte ou na totalidade teorias científicas. Pau que nasce torto jamais se endireita; Filho de peixe sabe nadar; De pequenino é que se torce o pepino; Tal pai, tal filho....

Tomemos como exemplo este último que de imediato relacionei com a infância, talvez por constatar que efectivamente nesta fase as crianças constituem um espelho das atitudes e comportamentos daqueles que lhes são mais próximos. Mas, como qualquer ditado popular a falta de especificidade da linguagem utilizada transmite a ideia de que todos os filhos são iguais aos pais. Mas então!? São iguais relativamente a qualidades físicas, psicológicas e/ou comportamentais?; São iguais em qualquer etapa da vida?; A socialização secundária não interfere em nada no desenvolvimento psíquico dos indivíduos?


Perante estas dúvidas e numa primeira análise poderíamos estabelecer um paralelismo com a perspectiva inatista do desenvolvimento que postula o património genético como factor determinante na constituição física e psíquica dos indivíduos e consequentemente na sua personalidade e desenvolvimento, reduzindo a socialização a um simples aprimorar do que já é inato. No entanto, numa segunda análise, poderíamos estabelecer uma conexão com a perspectiva ambientalista que postula a importância das experiências e dos estímulos externos na construção do “eu”, ou seja o indivíduo é percepcionado como produto do meio, mas na leitura de Tal pai, tal filho, seria produto exclusivo da influência do progenitor.


Assim, poderíamos considerar que esta ideia do senso comum espelha a importância do património genético e do património cultural no desenvolvimento humano, salientando a influência dos relacionamentos e da figura dos adultos significativos no desenvolvimento das crianças, mas sub-releva o papel activo e dinâmico do sujeito no seu próprio desenvolvimento e na construção da sua identidade influenciado não só pelos pais, mas pela família alargada, pela escola, pela comunidade e pelas experiências ao longo de toda a sua existência, podendo-se distanciar da herança cultural transmitida pela família nuclear.

Efectivamente, a concepção do desenvolvimento humano que predomina actualmente, postula que cada um de nós é o produto da sua herança genética e das interacções que estabelece com o meio, mas também lega ao próprio indivíduo a responsabilidade de participar activamente na construção da sua individualidade. Portanto, Tal pai, tal filho distancia-se de uma concepção construtivista e interaccionista do desenvolvimento, na medida em que não contempla as mudanças qualitativas que o ser humano sofre ao longo de toda a sua existência. Mudanças que se traduzem em reconstruções da individualidade e se reflectem nas formas de pensar, sentir e agir podendo desencadear novos modos de percepcionar o mundo e de viver nele.

Com esta reflexão, concluo a pertinência de consciencializar todos os actores da educação da influência do senso comum nas nossas interacções quotidianas, mas sobretudo a premência dos profissionais da educação adoptarem uma atitude crítica e auto-crítica face a este tipo de conhecimento empírico, adoptando concepções do desenvolvimento humano fundamentadas em teorias científicas, de modo a desenvolverem uma pedagogia construtivista, interactiva, motivacional e metacognitiva que promova o desenvolvimento cognitivo e psicossocial dos seus alunos.
Psicologia do Desenvolvimento X Educação ao longo da vida

A psicologia do desenvolvimento constitui uma área de estudo da psicologia que se debruça sobre as contínuas mudanças psíquicas que ocorrem nos indivíduos ao longo da vida, resultantes da interacção de múltiplos factores (biológicos, psicológicos, sociais, afectivos, culturais). Estuda, portanto, um muito complexo processo epigenético que ocorre em cada ser humano desde a concepção até à morte.

Contudo, tempos houve em que valorizou o estudo da infância e da adolescência, devido à predominância de mudanças visíveis, em detrimento do estado adulto, ao qual se associava uma certa estabilidade. Foi em meados do séc.XX com a teoria psicossocial de Erikson, a qual postula o desenvolvimento dividido por estádios durante toda a existência do indivíduo, que se assumiu definitivamente que o desenvolvimento biopsicológico não pára na idade adulta.

Esta concepção do desenvolvimento, com valorização de todas as etapas da vida, acompanha as transformações profundas que o progresso tecnológico e científico imprimiu nas sociedades ocidentais. Agora, a maior esperança de vida associa-se a exigências de adaptação e a novos papéis sociais que implicam constantes mudanças qualitativas e quantitativas nos indivíduos, resultando em sucessivas reconstruções do "eu".

Se nos reportarmos ao domínio profissional, é impensável, nos tempos actuais, considerar que os conhecimentos adquiridos durante a educação básica sejam suficientes e imutáveis durante toda a vida. Os saberes e as competências tornam-se rapidamente obsoletas, exigindo uma formação profissional e uma reciclagem permanente. Ao que parece, à luz da psicologia do desenvolvimento, o ser humano encontra-se preparado para estas novas exigências, pois uma das características que o diferencia dos outros animais é a sua plasticidade e flexibilidade que lhe dá uma capacidade ilimitada de aprendizagem ao longo da vida. Na realidade, o ser humano nasce quase despojado de comportamentos inatos, ficando obrigado a aprender para sobreviver. Esta sua capacidade de aprendizagem associada ao prazer pela exploração do meio e à sua adaptabilidade justifica a actual concepção de educação ao longo da vida perspectivada quer através do ensino formal, quer do informal.

Neste âmbito, creio ser pertinente referir algumas das conclusões de Delors et al, relativamente à educação contínua e global. Para estes, toda a sociedade tem responsabilidades educativas, pois «tudo pode ser ocasião para aprender e desenvolver talentos»[1] e todos têm um papel activo na educação, sendo desejável o abandono de posturas passivas. Efectivamente, a Educação não é só aquisição de conhecimentos, nem ocupa uma só etapa da vida, é cada vez mais importante a complementaridade entre os vários espaços educativos (família, comunidade, escola, meios de comunicação, empresas, instituições, associações....) e assentar em quatro indissociáveis e articuláveis aprendizagens. Aprender a Conhecer o mundo adquirindo uma cultura geral vasta e, simultaneamente, conhecimentos mais profundos em determinadas matérias, estando subjacente o aprender a aprender, cujo exercício da atenção, da memória associativa e do pensamento são áreas a não descurar; Aprender a fazer, ou seja conseguir pôr em prática os conhecimentos científicos e os de índole social, como a capacidade de comunicação, de trabalho em grupo, de gestão e resolução de conflitos; Aprender a viver juntos que consiste na resolução pacífica de conflitos, na compreensão e aceitação da diferença cultural, étnica, de opinião e na percepção da interdependência étnica e grupal subjacente ao convívio social; Aprender a ser, diz respeito ao desenvolvimento da pessoa como um todo, onde cada um aprende a ser autónomo e responsável pelas suas atitudes, a ter sentido crítico e a desenvolver as suas potencialidades físicas, sociais, intelectuais e artísticas.

Perante esta visão alargada da educação que ultrapassa a visão meramente instrumentalista há muito instaurada, podemos inferir que esta concepção da Educação global e contínua alicerça-se numa concepção interaccionista e construtivista do desenvolvimento humano, na medida em que defende o papel activo do sujeito na construção do seu conhecimento e personalidade, mas também a importância da interacção com os outros e com todo o meio envolvente.

Esta educação conduzirá o sujeito a um processo de desenvolvimento interior «cujas etapas correspondem às da maturação contínua da personalidade»[2]. Por outras palavras, a Educação Global ao longo da vida provoca mudanças contínuas e descontínuas no indivíduo sinónimas de reorganizações mentais que lhe permitirão atingir o auto-conhecimento, realização pessoal e redescobrir o mundo e os outros.

[1], [2] Delors, Jacques et al.(1996), Educação: Um Tesouro a Descobrir, Relatório para a Unesco da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI, p.101,187